terça-feira, 15 de novembro de 2016

SAPATOS

Debaixo da cama de minha mãe, eu via um par de sapatos todas as noites.
Os sapatos calados me lembravam um rosto triste.
Uma voz roca a suplicar alento.
Um dia inteiro de calor e labor intenso.
Um homem tenso.
De corpo magro e pele branca.
De bigode grosso sobre lábios finos.
Uma mão, um cigarro acesso.
Uma coluna de fumo que subia ao céu.
Uma noite perdida sem sonhos.
Uma beleza de mulher coberta por um véu.
Conheci um homem triste no mundo.
Conheci um homem, um mundo.
As manhãs chegavam logo.
Os sapatos sumiam com o dia.
Ao meio dia o sol ardia.
O mundo assava no asfalto.
As telhas dançavam sobre as casas.
E as crianças diziam: mãos ao alto!
No alto do morro do mucuripe.
Não importa se moro agora em Sergipe.
Desejo sonhar de novo.
Os sapatos ainda estão lá.
Os pés também.
Que bom...

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