sábado, 4 de agosto de 2018

MOÇA BONITA

MOÇA BONITA.

Sentir o mundo é coisa de gente. É conversa da gente. É mente, é coração; ás vezes, uma mera trapaça de um espertinho que, simplesmente, passa por aqui como todo mundo.
Sentir o mundo é olhar para dentro de si e vermos que do lado de cá não tem janelas, nem portas, nem brechas. É a verdade das tripas – nossas amigas ou inimigas, tuas velhas companheiras de antigas cantigas e intrigas.
A moldura do retrato do mundo foi feita pelo artesão mais velho da terra. O mundo este ente criado, este retrato batido, esta coisa de homem, este palco sagrado de atores mundanos nunca é o mesmo depois que o sol nasce. Tem um novo mundo a cada dia não importa nossa agonia, pois a imaginação da cabeça que esmaga o crânio de quem pensa é a mesma que concebe uma formula de salvação. Então, sentir o mundo é sentir o teu perfume. É, também, beijar tua boca, e ainda ouvir tua voz roca de tanto dar aulas, ou ver teu olho caolho ao amanhecer.
Sentir o mundo é degustar a boa comida, é ter certeza que existe uma despedida – esta cruel inimiga, é saber viver a vida seja ela boa ou sofrida.
Dizem que o mundo está ali. Dizem, também, que você está aqui. Nós e o mundo não temos lugar. Aqui, neste chão, terra de Adão andamos de mãos suadas. Este é o torrão cheio de encruzilhadas, de sertões e veredas, de moças alegres e tristes raparigas. Nossa herança é uma eterna caminhada, pois, cá não há lugar, ou lar, ou paradas.
E eu e tu, e tu e eu, e essa humanidade perdida, ou salva, ou redimida, amaldiçoada, ou abençoada; esta face alegre ou decepcionada, ou aquela senhora de nariz arrebitado a reclamar do negrinho no assento ao lado, ou a madre cheia de virtudes a derramar suas lágrimas sobre seu rosário somos a cara do mundo.
Sentir o mundo é ouvir o vento; seu assobio quieto, seu vendaval insatisfeito. Não é o vento que sopra o mundo, nem o mundo sopra o vento, os dois dançam nos quatro cantos da terra as melodias das noites, manhãs, madrugadas; das horas alegres, dos dias de porfias, dos olhos arregalados e dentes cerrados, no crepúsculo, no fim da tarde, de céu cor de gema com suco de laranja.
Sentir o mundo é sentir o ar que traz teu cheiro, teu carinho companheiro, teu sorriso faceiro, tua mão amiga, teu afeto verdadeiro.
Mas, na calçada do vizinho tem um buraco, e o buraco é fundo, é do tamanho do mundo. Nele, por vezes, sucumbem os sonhos meus e teus. Nele estamos unidos de mãos dadas, nele se cruzam destinos com ou sem tinos, ou encruzilhadas velhas com as novas, pois toda calçada tem provas, tem testemunha, tem pedra, ou calçada simplesmente.
Sentir o mundo é olhar-se no espelho e mirar a eternidade, a essência de algo sem delimitada identidade. Sentir o mundo é ver no vidro espelhado tantas faces possíveis num fração de segundo. É um delírio, um sonho conjunto de muitos, uma realidade tão dura quanto pedra, um vapor que aquece o tempo e me traz você moça bonita que encanta meu canto enquanto também passo...