segunda-feira, 14 de novembro de 2016

SOCIAL

Às vezes, sinto falta do meu rosto cravado no espelho da consciência;
Às vezes, sinto náuseas quando ouço o sopro das palavras;
Às vezes, prefiro a hipocrisia de dizer que sou hipócrita; isso me faz bem, sim, muito bem.
Há momentos que me basto; não preciso de ninguém. Qualquer ser humano seria expulso de minha sala.
Sala por vezes escura;
Sala por vezes úmida;
Sala por vezes calada;
Sala por vezes feliz.
Sala fétida, nojenta, ciumenta, assassina, cândida, cheirosa, dengosa, santa - profana sala d’alma!
Eu sou o centro da sala onde todos falam e se calam; onde o meu viver é o refino de minhas tripas.
- Ah, que saudade de minhas amigas, minhas raparigas!
- Dane-se o mundo inteiro!
- Eu sou eu!
Ando nas ruas com meus pés; não preciso do teu.
Ando nas ruas com meus olhos; a luz do dia não te imploro.
Ás vezes alegro me com o teu sorriso.
Às vezes recordo-me das canções da infância.
Às vezes aperto tua mão e sinto paz n’alma.
Isso me acalma;
Isso me faz bem.
É como os sinos de Belém, à meia noite, tocados na Igreja dos Jesuítas perto da Francisco Holanda.
Vejo um rio que corre para todos; vejo almas que se unem-cada uma trás uma flor na mão; todos tem uma esperança; todos tem uma criança.
Às vezes sinto falta do meu rosto infante cravado no espelho das horas...

ONDINAS

"Solidão, solidão, tudo é solidão". Disse o homem do quarto escuro.
O moço abriu a janela de seu aposento para ver o mundo.
E este estava vazio.
Tão solitário quanto seu leito; um leito sem mácula de um pecador arrependido.
Há solidão nessa esfera que gira; em cada giro seu se esvai meu sonho e o teu.
Eles são nuvens, são fumaças; vapores que sobem da terra e não voltam mais.
O moço franzino, de lençol na mão, suplicou ao mundo um amigo.
- Quem tem amigo, tem inimigo; o homem é como o camaleão.
- Sim, mas o nada de nada é igual a nada!
- Quem tem o nada tem alguma coisa!
"Solidão, solidão, tudo é solidão. Disse o mago do quarto escuro.
O homem foi ao centro, fez um seguro; garantiu sua vida.
A morte não tem garantia; se paga à vista e não há devolução.
Viver é da escada apenas uma subida; uma alma sempre sofrida, contudo, sem medo de ser.
O rapaz, de vela na mão ascendeu sua luz mais uma vez e fez um pedido: "Companhia".
- Amiga caridade, faça-me uma bondade! Será que tem alguém no mundo?
- Não se pode confiar na sombra dos outros!
- Mas, essa sorte? Que desgraça ser um ser!
- Precisas ser forte!
- Sou um fraco, que mora no quarto, tão escuro como o mundo.
"Solidão, solidão, tudo é solidão. Diz o poeta.
Amei cedo uma moça garrida.
Sua pele era seda pura.
Seus seios duas peras maduras.
Suas coxas eram eram como o mármore polido.
Fui flexado pelo cupido. "Má sorte minha".
A moça virou retrato, de um quarto escuro, de um morador da rua sinistra onde ninguém passa.
- Desgraça!
- Não diga isso.
- Quem?
Uma ondina me disse um dia: "No mundo tem companhia; inclina o peito, abre os olhos para ver direito..."