domingo, 13 de novembro de 2016

COMPANHEIRA

O que digo de mim será sempre suspeito, contudo, quando falo dos homens eu falo direito.
O meu delito escondo no peito.
A minha dor divido com outros.
Culpo o mundo;
Culpo a rua;
Culpo o cachorro do vizinho ou o radio ligado na outra casa.
Ah, se o mundo fosse só meu!
Ah, se todas as mulheres fossem só minhas!
Ah, se eu soubesse quem sou eu!
Sou uma flecha atirada no tempo.
Uma probabilidade de vida.
Sou a chegada, sou a partida.
Uma risada, uma triste cantiga.
Ontem vi o sol deitar-se cansado no horizonte quieto.
Ontem vi meu pais trabalharem muito para terem pouco.
Ontem me deram lições de vida.
– A sobrevivência é tudo!
– A carne da fera não pode faltar!
Mas as flores vestem o mundo quando há sonhos.
Todo homem deve sonhar.
Toda alma precisa amar.
Toda carne transgride, mas, aprende.
São meus pensamentos ventos que o mundo espalha.
Sou eu um ser de ferro e palha.
Um espantalho da gula e da soberba do outro.
Ah, se eu vivesse só.
Ah, se um solitário ganhasse o salário da fama.
Ah, se no mundo coubesse somente a minha trama.
Mas, minha alma clama pelos dedos finos, e pelas mãos de lã molhada.
Mas, minha alma reclama pela dama que se deita em minha cama.
Mas, meu coração insatisfeito encolhe os beiços no sofá da sala.
O silêncio me mata sem minha outra parte.
A quietude me dá impaciência no vazio da casa sem ela.
Bela criatura da terra; bela companheira de todas as horas.
A contradição é sua amiga.
Ela é como eu; ela é fluída, é líquido como nós.
Evapora no tempo como vós.
Escorre pelo ralo como água.
Andamos juntos, mesmo, quando não nos conhecemos.
Ela é o implícito dos meus ditos.
É minha amiga; Cinderela, bruxa do reino, gordinha, magrinha, branquinha, pretinha, amarela…

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